Acreditem ou não, eu já voltei. E dessa vez, sem tantas delongas já que realmente tenho algo que quero escrever hoje. E vamos a isso, antes que a idéia se perca.
Veja você que coisa engraçada, pois que em 21 anos de sofrida autocomiseração eu me vejo tendo um pensamento inusitado: eu nunca tive adolescência. Ou pelo menos nunca me senti tendo uma. Explico: não é tanto pela minha falta de amigos ou festas para as quais nunca fui convidada, e sim pela minha falta de rompantes bruscos com a realidade. Não expliquei nada? Veja bem, é que é difícil mesmo. Mas a questão é que quando me deparo com relatos adolescentes de qualquer espécie, sejam eles atuais ou de anos atrás, tenho pouco com que me identificar neles. E isso seria algo de se esperar, considerando que já não sou mais tão jovem, mas não me lembro de já ter sido um dia, e é essa a minha preocupação. Parece que já entrei na idade adulta pensando como uma velha de 60 anos, porém sem um terço da sabedoria, só com a falta de viço característica.
Meus diários de 15 anos (se eu já tivesse escrito algum; minhas idéias sempre se perderam por cadernos escolares e desenhos amarrotados pelo quarto) nunca tiveram CERTEZA de nada, algo que me parece um sentimento tão comum, embora paradoxal, nos adolescentes. Porque sim, estão todos mudando de idéia com a velocidade de um cavalo de corrida esbaforido, porém com cada nova negação da idéia anterior vem também uma renovada e inabalável certeza: eu penso, eu sei, eu sou. Eu não faço idéia do que sou, mas eu sou. Pelo menos é como interpreto suas palavras sempre tão indolentes.
Não digo, pelo contrário, que nunca tive meus momentos. Mas as poucas certeza que cheguei a ter nessa fase continuam me acompanhando até hoje, com raras exceções e mudanças de contexto aqui e ali. E, na verdade, isso é o que mais me deixa na dúvida: teria eu ainda a mentalidade infantil de uma menina de 15 anos? Ou será que nunca tive uma mentalidade assim? Às vezes chego a pensar que passei de criança à adulta muito rápido, e que foi essa transição repentina que me impediu de continuar crescendo normalmente desde então. Passei de criança triste a adulto precoce e adulto precoce continuo desde então, com pouco acrescido ou desenvolvido, embora já devesse estar quase saindo de casa nas atuais circunstâncias. Um adulto que sabe o que fazer, mas pouco ou nada sabe sobre como entrar em ação. Em resumo, um adulto torto que ainda vive como um adolescente, mesmo sem pensar como um. Sei que não faz nenhum sentido, mas sempre soube que meu sofrimento não era o maior do mundo, embora a dor de uma criança que morre de fome na África nunca parecesse maior ou mais importante do que a minha por não ter um namorado e minha amiga ter arrumado um, aqui e agora. Óbvio que este é um exemplo banal e até estúpido, pois ninguém em sã consciência faria uma comparação dessas. Mas outro mais interessante é eu ser a única da minha turma a perceber, aos 13 anos de idade (nem sei se tinha tudo isso) que o professor não estava protegendo as alunas do outro grupo de seminários simplesmente porque não tinha tempo para se preocupar com esse tipo de picuinha. Mas não acho necessariamente que fosse esperta para a idade ou mais inteligente que a média. Gosto de pensar que sim, mas se assim fosse, meu eu de 9 anos atrás estaria muito decepcionada em constatar que adulta fajuta ela viria a se tornar. Não, acho simplesmente que, por alguma razão, acontecimentos relativamente banais me fizeram passar por um sofrimento maior do que o que deveria ser suportado por crianças daquela idade. E me fizeram perceber que não, adultos não estão interessados no que as crianças pensam. Negue se quiser, você sabe que é verdade. Não importa o quanto você se julgue conectado à sua "criança interior", você não sabe e nem muito menos quer saber o que as crianças de hoje pensam. Ou talvez não. Talvez o que você saiba mesmo é que tudo que eu escrevi aqui é o mais fino da bosta e que você se preocupa sim com tudo que o seu filho, irmão ou sobrinho de 7 anos sofre ou deixa de sofrer. E eu espero, sinceramente, que você esteja entre os indignados do segundo caso e que nunca faça uma criança crescer cedo demais por falta de interesse sincero e diálogo sem meias verdades. Eu não terei filhos por que sei que não tenho essa habilidade. Mas se você os teve, tenha a decência de desenvolvê-la.
À propósito, se preocupar com o que uma criança pensa não é saber se ela está indo bem na escola ou se ela não esqueceu de levar a merenda, ou o casaco. Mas tudo isso é parte do pacote.
Au revoir.